A Comunhão Espiritual

Rita De Blasiis[1]
 
“Eis que Jesus veio ao seu encontro e lhes disse: ‘Alegrai-vos!’” (Mt 28, 9).
 
O que significa para nós a Eucaristia?
 
Em uma consulta inicial a documentos da Igreja, com o intuito de verificarmos o que nos dizem esses documentos a respeito da fé eucarística, logo vamos encontrar a importante afirmação de que essa fé “chegou até nós, por graça da Divina Providência, na sua pureza original, em virtude sobretudo da doutrina de dois Concílios ecumênicos: o de Trento (1545-1563) e o do Vaticano II (1962-1965)”[2].
Diante dessa assertiva, podemos nos reconhecer como herdeiros, em vida, de um legado espiritual que nos alcança, sendo transmitido de geração a geração, por obra e graça de Deus, e por perseverante esforço de muitos dedicados cristãos que nos precederam.
Tal reconhecimento nos coloca diante do espelho d’alma que nos faz refletir sobre o nosso papel nessa trajetória da fé eucarística pelo mundo. Podemos também nós, sim, perguntarmo-nos, como compreendemos o mistério eucarístico. O que ele significa para nós?
Essa indagação não é despropositada, ela está no Questionário do documento Lineamenta do Sínodo dos Bispos, XI Assembleia Geral Ordinária, “A Eucaristia: fonte e ápice da vida e da missão da Igreja”, nos seguintes termos:
 
3. Percepção do mistério eucarístico: Qual a ideia dominante que os sacerdotes e os fiéis das vossas comunidades têm da Eucaristia: sacrifício? Memorial do mistério pascal? Preceito dominical? Banquete fraterno? Ato de adoração? Outras…? Na prática, prevalece alguma destas dimensões? Quais os motivos dessa preferência?[3] (o grifo é nosso).
 
A diversidade de respostas que obteremos, caso realizemos uma pesquisa dessa natureza em uma única comunidade de fé, provavelmente, será extraordinária no âmbito da percepção individual do mistério eucarístico, mas terá também, pelo menos assim o esperamos, o fundamento comum que vem do próprio Catecismo da Igreja Católica.
A leitura do Artigo 3, “O Sacramento da Eucaristia”, (p. 365 a 391), nos proporciona excelente material de estudo e reflexão com inúmeras notas ao pé da página que nos remetem a outros importantes documentos da Igreja. Destacamos, deste capítulo todo, a citação de Santo Tomás de Aquino e de São Cirilo, a respeito do mistério eucarístico:
 
“A presença do verdadeiro Corpo de Cristo e do verdadeiro Sangue de Cristo neste sacramento não se pode descobrir pelos sentidos, diz Santo Tomás, mas só pela fé, baseada na autoridade de Deus. Por isso, comentando o texto de São Lucas 22,19 – “Isto é o meu corpo, que é dado por vós” – São Cirilo declara: “Não perguntes se é ou não verdade; aceita com fé as palavras do Senhor, porque ele, que é a verdade, não mente”. (CaIC, n.1381, p.381).
 
Para cada pessoa, o significado da Eucaristia, portanto, poderá ser definido de diversas maneiras. Todavia, se para nós, a Eucaristia é “fonte e ápice de toda a vida cristã”, teremos, em comum, nessa participação no sacramento da Sagrada Eucaristia, a mesma fé viva que impulsionará e sustentará o nosso ardente desejo de estarmos em permanente e real comunhão com Cristo.
 
O que é estar em permanente e real comunhão com Cristo?
 
Essa será também uma resposta de cunho pessoal, cada qual aportará a sua própria experiência de comunhão e a definirá apresentando o seu conceito estabelecido a partir da vivência que tem e do conhecimento que construiu por meios diversificados, sobre essa verdade de fé.
Entretanto, tenhamos ou não profunda ciência sobre o mistério eucarístico do ponto de vista doutrinário, nossa participação na Eucaristia demanda, em primeira instância e essencialmente, fé perante um dogma da Igreja Católica.
O Capítulo III do Catecismo, em seu artigo 1, afirma que a fé é um ato humano mediante o qual podemos “prestar pela fé, à revelação de Deus plena adesão do intelecto e da vontade” e, entrar, assim, em comunhão íntima com ele”. (CaIC, n.154, p.51).
Em nossa reflexão, estamos enfocando a questão da comunhão com Cristo. A finalidade última da Catequese, conforme nos apresenta o Catecismo, é nos levar à comunhão com Jesus Cristo, pois, “só ele pode conduzir ao amor do Pai no Espirito e pode nos fazer participar da vida da Santíssima Trindade”. (CaIC, n.426, p.51).
Nos reportamos, então, para refletirmos sobre essa questão, ao momento em que “por Maria, o Espírito Santo começa a pôr em comunhão com Cristo os homens, objetos do amor benevolente de Deus”. (CaIC, n.725, p.209).
Configuram-se e evidenciam-se nessas duas atitudes, dois passos muito relevantes para nós: no primeiro, a Vontade do Pai, em sua manifestação de amor vindo ao nosso encontro e se revelando a nós pela Palavra. Na trajetória religiosa que vivenciamos, após escutarmos essa Palavra – Deus que nos visita e nos convida a nos amarmos uns aos outros – fazemos a nossa profissão de fé. Nesse segundo passo, portanto, somos nós que vamos ao encontro de Deus, manifestando o nosso amor.
Fomos convidados a seguir o exemplo de Maria. Ela vivenciou a comunhão com Cristo antes de nós; ao dar o seu sim, pelo poder do Espírito Santo, tornou-se Mãe de Jesus e nos ensinou essa questão primordial: para comungarmos precisamos estar dispostos a cumprir a Vontade de Deus. Mas o que é cumprir a Vontade do Pai? É atender ao seu chamado, à sua convocação para vivermos, todos e todas nós, constantemente em sua presença, ou seja, em seu amor.
Maria prestou pela sua fé, plena adesão à revelação que lhe foi feita. E nós, como nos comportamos frente à essa realidade? Real e permanentemente comungamos com Cristo? O conhecimento que temos, a nossa percepção do mistério eucarístico e a nossa fé nos possibilitam a certeza de que Jesus está sempre presente na Eucaristia. Ele vem, sim, ao nosso encontro. E sabemos que ele deseja ardentemente comer conosco essa ceia pascal. (Lc 22, 7-20). A ciência que Jesus tinha do que haveria de padecer o levou a dizer isso aos apóstolos na Última Ceia. Entretanto, essa realidade não se consumou em sua Paixão e Morte, esse sacrifício se perpetua:
 
É Cristo mesmo, sumo sacerdote eterno da Nova Aliança, que, agindo pelo ministério dos sacerdotes, oferece o sacrifício eucarístico. É também o mesmo Cristo, realmente presente sob as espécies do pão e do vinho, a oferenda do sacrifício eucarístico. (CaIC, n.1410, p.390).
 
São vários os nomes que podemos empregar para designar o sacramento da Eucaristia: Ceia do Senhor, Memorial da Paixão, Comunhão; destacamos aqui, a expressão “Santa Missa”.
O Catecismo da Igreja Católica, conforme as menções supracitadas, expostas no Artigo 3 “O Sacramento da Eucaristia”, p. 366, esclarece a razão do uso de cada termo, afirmando que “Santa Missa “ é utilizado porque “a liturgia na qual se realizou o mistério da salvação, termina com o envio dos fiéis (“missio”: missão, envio) para que cumpram a vontade de Deus em sua vida cotidiana”. (CaIC, n.1332, p.367).
Jesus, na Última Ceia, fez essa recomendação aos apóstolos: “Amai-vos uns aos outros, assim como eu vos amei” (Jo 15,12). Presente no meio deles, abençoou e partilhou o pão e o vinho, e enviou os seus discípulos com a responsabilidade de anunciar a Boa Nova mediante a transmissão dos seus ensinamentos e por meio de ações concretas que se tornassem exemplos vivos de amor ao próximo, de cuidado para com a comunidade cristã primitiva, composta de todos que buscavam socorro material e espiritual. Ainda presente entre nós, na Eucaristia, Jesus também nos envia com a mesma responsabilidade do testemunho missionário em comunhão com ele, a comunidade cristã hodierna continua a ser formada por pessoas que necessitam de amparo fraterno.
 
O que é testemunho missionário em comunhão com Cristo?
 
Em primeira mão, o testemunho missionário nos solicita plena atenção à nossa vida moral, entendendo-se que “a vida moral é um culto espiritual”, com a devida ciência de que “o agir cristão se nutre da liturgia e da celebração dos sacramentos”. (CaIC, n. 2047, p.538).
Se nos ativermos à etimologia da palavra cultuar, vamos encontrar o termo “culto” com o significado de algo que se conseguiu cultivar, algo cultivado: um território culto. Prestar atenção à nossa vida moral, portanto, é cuidarmos do terreno do nosso espirito, fazendo nele florescer o amor e os seus frutos. A liturgia da Palavra e a Eucaristia são, nesse sentido, sementes que recebemos e precisamos lançar em nosso meio.
Esse é o testemunho missionário ao qual Jesus nos envia, a cada celebração Eucarística. Devemos nos recordar sempre de que, ao comungarmos, nos comprometemos, diante do Cristo, a dar realmente esse testemunho. Somos fiéis da Igreja de Deus e, nessa posição, compreendemos que “a fidelidade dos batizados é condição primordial para o anúncio do Evangelho e para a missão da Igreja no mundo”. (CaIC, n. 2044, p.537). O “fiel” se distingue como tal, não apenas porque crê, mas porque age com verdadeira e sincera fidelidade aos princípios nos quais acredita.
Podemos, frente a isso, exortar a todos a quem nos dirigimos, com os quais nos relacionamos, amai-vos uns aos outros como nós vos amamos? Perguntamos a eles se estamos tentando – fielmente – amá-los como Cristo nos amou? Ora, o rosto do irmão que sofre não mente e o amor é remédio eficaz para todos os males. Onde grassa a dor sem alivio e sem esperança, sem compreensão mútua e sem fé, sem a aceitação resiliente que promove a transformação moral, não existe testemunho missionário amor.
Os 360º graus do nosso entorno social estão ao alcance do nosso olhar e deveriam estar também ao alcance do nosso coração. Quanto nos mobiliza o rosto do irmão que sofre? Nós o reconhecemos como tal? Ou utilizamos os indicadores superficiais do seu contexto de vida e de sua identidade circunscrita a essa condição passageira em que ele se encontra, para julgá-lo de forma que possamos nos sentir autorizados a ignorar o seu sofrimento?
O impulso compassivo é a marca mais singular de Jesus. Na narrativa de todos os evangelistas, e em especial, no Evangelho de São Lucas, Jesus manifesta a sua compaixão ininterruptamente diante de todos quantos o procuram e ele mesmo toma, também a iniciativa de buscar aqueles que as autoridades religiosas da época rejeitavam, como é o caso de Zaqueu, o publicano.
Jesus manifesta a sua compaixão de diversas formas, se compadece da multidão e lhes dirige a palavra confortadora e esclarecedora (Mc 6,34); se compadece dos enfermos e os cura (Mc 3.7-12; Lc 6.17-19); se compadece dos que o procuram para pedir ajuda, sejam eles judeus ou não, como e o caso do centurião (Lc 7, 1-10); se compadece de Maria Madalena que lamenta a morte de seu irmão e chora com ela (Jo 11, 32-35); se compadece da falta de fé de Tomé e lhe apresenta suas próprias chagas para que o apóstolo as toque e creia fundado na constatação da verdade (Jo 20, 26-29); se compadece do soldado que o vem prender e restaura o ferimento causado pela espada de Pedro (Jo 18, 10-11;Lc 22, 49-51); se compadece até dos que o crucificaram, pedindo perdão ao Pai por eles (Lc 23,34).
A visão do sofrimento humano tocava o coração de Jesus de uma forma sublime, a sua resposta era sempre um ato de misericórdia, com a necessária e devida orientação ou correção. Os quadros vivos dos que buscavam socorro no Cristo, narrados nas páginas dos Evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas e João, no entanto, despertam nossa atenção para uma questão. O olhar distinto dos evangelistas sobre a trajetória de Jesus, da qual eles acompanharam e participaram, transparece nos seus enfoques principais, na forma como relatam os acontecimentos. Em especial, São Lucas, que não conviveu com o Cristo, se ocupa desta questão que nos ocorre agora: como Jesus fitava o sofrimento humano? Poderíamos abstrair de suas atitudes, de seus atos, de suas palavras essa referência para aprendermos com ele a contemplar o rosto do irmão que sofre, a nos sensibilizarmos diante de sua dor, socorrendo-o também ou mesmo buscando-o aonde ele estiver?
 
Como Jesus fitava o sofrimento humano?
 
Sobre o ver e o julgar, no olhar perspicaz e compassivo de Jesus, a primeira observação é bastante clara e objetiva, e por demais conhecida: “Não julgueis, e não sereis julgados; não condeneis, e não sereis condenados” (Lc 6,37). E também nessa passagem Jesus ressalta: “Por que vês tu o argueiro no olho de teu irmão e não reparas na trave que está no teu olho”? (Lc 6, 41). No âmbito das relações interpessoais, portanto, Jesus recomenda sempre o uso da misericórdia. Fazer o que desejaríamos que fizessem para nós, ou seja, nos colocarmos no lugar do outro e simplesmente ajudarmos, cuidarmos do nosso irmão.
No trato com o coletivo, o procedimento é o mesmo: “Ao desembarcar, Jesus viu uma grande multidão e compadeceu-se dela, porque era como ovelhas que não têm pastor. E começou a ensinar-lhes muitas coisas” (Mc 6,34). Mas, Jesus não ensina apenas por meio de sua palavra, ele exemplifica o que diz, preocupando-se também com o alimento material, multiplicando pães e peixes e curando os enfermos. Ele presta um atendimento indistinto e integral, não é feita uma triagem, tão somente todos recebem, igualmente, o auxílio de que necessitam. A generosidade do amor de Jesus se manifesta como procede o nosso Pai que “faz nascer o sol tanto sobre os maus como sobre os bons, e faz chover sobre os justos e sobre os injustos.” (Mt 5,45).
Questionado pelos discípulos, volta também para eles, o seu olhar misericordioso e afiança, igualmente, o amor do Pai pela humanidade sofredora e ignorante: “A estas palavras seus discípulos, pasmados, perguntaram: “Quem poderá então salvar-se”? Jesus olhou para eles e disse: “Aos homens isso é impossível, mas a Deus tudo é possível” (Mt 19, 25-26).
O evidente propósito de Jesus era explicitar e distinguir a determinante “misericórdia” e fazer com que todos compreendessem a salvação como um projeto coletivo que só pode se dar mediante o amor reciproco regendo as relações e clamando pela intervenção da graça de Deus. Naturalmente nisso se incluem desde os quefazeres cotidianos até as mais complexas atividades humanas, e também, com a devida prioridade, desde as orações individuais do dia a dia e demais deveres do católico até a participação coletiva na Celebração Eucarística e nos movimentos pastorais.
Jesus, portanto, na sua leitura do mundo que o circundava, pelas pregações que realizou e atitudes que tomou, não deixou margem de dúvida, o plano salvífico do Pai não atendia às demandas da elite da época, nem mesmo à própria elite intelectual e religiosa que foi contemporânea do Cristo. Essa elite simplesmente se voltou contra ele porque Jesus colocou os valores essenciais e fundamentais nos seus devidos lugares, definiu prioridades segundo a justiça divina, nunca segundo o que as conveniências dos hipócritas de seu tempo determinavam.
Esse ponto constitui o aspecto fulcral da passagem de Jesus pelo mundo, a Cruz que ele carrega e dignifica, é signo também de uma encruzilhada que nos interroga: ao nos depararmos com o Cristo crucificado, que rumo tomamos? Ora, os doutores da Lei, os escribas e os fariseus tinham conhecimento, mas, eram impiedosos. Agiam sempre privilegiando seus próprios interesses e alinhavam-se aos que oprimiam a maioria pobre daquele tempo. A Impiedade, a incoerência entre o que deviam fazer e o que, em verdade, realizavam, a obstinação em não admitir o próprio erro, fez deles os únicos que não foram perdoados por Jesus. E não foram perdoados não porque Jesus não quis lhes conceder esse perdão. A condição sine qua non para sermos perdoados é a de reconhecermos nossos próprios erros e, por conseguinte, pedirmos perdão por tê-los cometido.
Nas encruzilhadas da existência, nos momentos em que somos instados a fazer escolhas, o rumo a seguir é sempre o proposto por Jesus, ou seja, não impor sofrimento a ninguém, cuidar dos que sofrem, e de nossa parte, sofrermos com dignidade. Compreendido o sofrimento como tudo aquilo que nos desafia no sentido de superarmos obstáculos, de aceitarmos o que não tem solução segundo nossa concepção e nosso desejo, e de aproveitarmos o ensejo do desafio que a vida nos propõe para crescermos moral, intelectualmente e em qualidade de sentimentos, também.
A crueldade impiedosa do hipócrita que Jesus refuta é a de condenar, culpabilizar o outro por estar ele em situação de pobreza, de enfermidade, ou outros tipos quaisquer de sofrimento, de forma que se sinta, esse impiedoso hipócrita, justificado por não se compadecer e não prestar auxílio fraterno. Não raro, ademais, o hipócrita coloca a cruz nas costas dos outros e os condena a uma condição de vida em que a opressão fundada na má interpretação da Lei autoriza a exploração do indivíduo e o seu martírio moral.
Jesus, pelo contrário, agia como um médico realmente, lançava sobre a pessoa o seu olhar compassivo e fazia tudo o que podia por ela. Desta forma, ele promoveu a transubstanciação do mal todo da humanidade passada, de seu tempo e futura, em bem, ao outorgar a própria vida por amor a nós e em obediência ao Pai. Portanto, “quando a Igreja celebra a Eucaristia, rememora a páscoa de Cristo, e esta se torna presente: o sacrifício que Cristo ofereceu, uma vez por todas na cruz, torna-se sempre atual”. (CaIC, 2017, n. 1364, p.376). É dessa atualização que somos chamados a participar.
 
Como se dá a nossa participação no santo sacrifício do Cristo?
 
Nos deparamos aqui, novamente, com a menção que fizemos ao iniciarmos a reflexão sobre o que significa testemunho missionário em comunhão com Cristo. O Catecismo esclarece que “na liturgia e na celebração dos sacramentos, oração e doutrina se conjugam com a graça de Cristo, para iluminar e alimentar o agir cristão”. (CaIC, n. 2031, p.534). Nesse aspecto, com referência ao “agir cristão”, fica claro, então, que o conjunto da vida cristã que pode ser compreendido como a nossa vida moral, encontra sua fonte e seu ponto culminante no sacrifico eucarístico.
Estar em comunhão com Cristo, portanto é assumir a responsabilidade de fazer o que ele nos pede, dando testemunho do amor que ele ensinou e que dele recebemos para compartilharmos com nossos irmãos. O sacrifício, portanto, é nosso também, somos hóstia viva que se oferece a Deus.
Em sua oração intitulada “Ato para a comunhão espiritual”, Santo Afonso Maria de Ligório implora a Jesus: “não consintais, Senhor, que de vós jamais me aparte”. (SAINT-OMER, 1961, p. 236). Esse pedido pode ser interpretado como expressão da firme intenção de Santo Afonso de manter-se fiel a Cristo e como uma solicitação de amparo no sentido de que ele nunca se negasse a dar o devido testemunho cristão no mundo. São João Crisóstomo, a esse respeito, ressalta:
 
“Saboreaste o sangue do Senhor e não reconheces sequer o teu irmão. Desonras esta mesa, se não julgas digno de partilhar o teu alimento aquele que foi julgado digno de tomar parte nesta mesa. Deus libertou-te de todos os teus pecados e chamou-te para ela; e tu nem então te tornaste mais misericordioso[4]”. (CaIC, 2017, n. 1397, p.387).
 
Neste sentido, evidencia-se que negarmos a dignidade humana, os direitos de nosso irmão como filho de Deus e como cidadão, é nos apartarmos de Jesus: a misericórdia divina nos alcança mediante a comunhão eucarística e nós não a estendemos a todos com a mesma generosidade com que fomos agraciados.
Santo Afonso Maria de Ligório, por outro lado, aborda também nessa oração, a especial condição daqueles que, por algum motivo de força maior, estão impedidos de receber a comunhão sacramentalmente e nos ensina a rogar que Jesus venha espiritualmente ao nosso coração. Desta forma, Santo Afonso abre o pressuposto, ou pelo menos nos insta a refletirmos sobre o fato de que a comunhão pode ser feita e vivida sem a presença das duas espécies, a hóstia e o vinho consagrados. É certo, entretanto que, seja pelo ardente desejo de estar unido a Cristo, por meio da prece, participando de uma Celebração Eucarística online, seja mediante a participação presencial na Santa Missa, recebendo a Sagrada Comunhão, estamos vivenciando uma situação de aprendizagem profunda.
Esse é o magistério ordinário e universal dos Bispos e do Papa em comunhão com o Cristo, ensinar “aos fiéis a verdade em que se deve crer; a caridade que se deve praticar e a felicidade que se deve esperar”. (CaIC, n. 2034, p.535).
Ora, se cremos, agimos, manifestando o nosso amor a Deus, e ao próximo como a nós mesmos, e se buscamos amar como Jesus amou, a felicidade que esperamos é exatamente essa, a de aprender a amar como o Cristo, com sacrifício, mediante a total entrega de si mesmo.
“Alegrai-vos[5]”! – disse Jesus ressuscitado às mulheres que foram visitar o túmulo de seu Mestre amado e as enviou como portadoras dessa notícia: ele estava vivo! Alegremo-nos também, Jesus está vivo entre nós e nos envia como testemunhas de que aquilo que é impossível para os homens é possível para Deus, pois, ” Deus é amor” (Jo 4,8). Ele se revela na Eucaristia e habita o coração de quem o ama e também ama a seus irmãos. Nesse amor recíproco, na fé e na união com Cristo se funda a comunhão espiritual que nos faz Igreja. Oh inefável fonte de alegria e de sofrimento! Enquanto houver sofrimento no mundo, sofreremos juntos, mas também, enquanto estivermos unidos a Jesus, haverá júbilo e paz em nossos corações esperançosos.
 
Rita De Blasiis
Uberaba, 28 de agosto de 2020.
 
Referências Bibliográficas
 
BÍBLIA CATÓLICA: NOVO TESTAMENTO. Disponível em: <https://www.bibliacatolica.com.br/>.
 
CATECISMO da Igreja Católica. São Paulo: Loyola e Petrópolis: Vozes, 2017, p.51, p.209, p.367, p.376, p.381, p.390, p.534-535, p.537-538.
 
SAINT-OMER. As mais belas orações de Santo Afonso. Petrópolis: Vozes, 1961, p. 236.
SÍNODO DOS BISPOS. XI Assembleia Geral Ordinária. A Eucaristia: fonte e ápice da vida e da missão da Igreja. 05/02/2004. Disponível em: http://www.vatican.va/roman_curia/synod/documents/rc_
synod_doc_20040528_lineamenta-xi-assembly_po.html>. Acesso em: 14 ago. 2020.
Sites consultados
 
https://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/documents/rc_con_cfaith_doc_28051992_communionis-notio_po.html
 
http://www.vatican.va/roman_curia/synod/index_po.htm
 
http://www.vatican.va/roman_curia/synod/documents/rc_synod_doc_20040528_lineamenta-xi-assembly_po.html#O%20Sacramento%20da%20nova%20e%20eterna%20alian%C3%A7a
http://www.vatican.va/roman_curia/synod/documents/rc_synod_doc_20051022_message-synod_po.html
[1] Pedagoga, Mestre em Educação. [2] SÍNODO DOS BISPOS. XI Assembleia Geral Ordinária. A Eucaristia: fonte e ápice da vida e da missão da Igreja. 05/02/2004. Disponível em:< http://www.vatican.va/roman_curia//synod/documents/rc_synod_doc_ 20050707_instrlabor-xi-assembly_po.html>. Acesso em: 14 ago 2020. [3] SÍNODO DOS BISPOS. XI Assembleia Geral Ordinária. A Eucaristia: fonte e ápice da vida e da missão da Igreja. 05/02/2004. Disponível em: <http://www.vatican.va/roman_curia/synod/documents/rc_synod_doc_ 20040528_lineamenta-xi-assembly_po.html>. Acesso em: 14 ago 2020. [4] São João Crisóstomo, In epistulam I ad Corinthios, homilia 27. 5: PG 61, 230. [5] Mt 28, 9.

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