O Curso Propedêutico, como todas as etapas da Formação Inicial e Formação Permanente do ministério ordenado, possui uma dimensão importante, considerada básica para as demais dimensões. Trata-se da Formação Humano-afetiva. Os aspectos emocional, afetivo e humano em geral são muito importantes para considerarmos a pessoa humana sadia, capaz de exercer bem o nobre ministério que a Igreja lhe confia para continuar a missão de Jesus Cristo.
Os desafios da vida atual provocam nas pessoas, em geral, e nos jovens, em especial, uma série de carências, desvios, desequilíbrios, transtornos e patologias: insegurança, medo, tensão, ansiedade, esquizofrenia, neuroses e até psicoses. Quase sempre nos deparamos com pessoas descompensadas afetivamente, sofrendo de depressão, transtorno bipolar, síndrome do pânico, dentre outras enfermidades que causam muitos sofrimentos psíquicos. Certas experiências na área afetiva também podem gerar desequilíbrios, seja na perspectiva homoafetiva, seja na hétero.
São conhecidas estatísticas atuais que apontam o crescimento do nível de ansiedade e sofrimento psíquico, principalmente entre jovens e adolescentes, agravados com a pandemia do Coronavírus. O distanciamento físico a que fomos todos submetidos tem revelado consequências preocupantes. Num contexto em que já havia desafios em termos de relacionamento doméstico, famílias mal constituídas e lares esfacelados, somando a um nível lamentável de educação escolar, a tendência seria mesmo de agravamento da saúde psíquica. E é isso que vemos acontecer, infelizmente.
Além da saúde física, a saúde psíquica é muito importante para se chegar a uma saúde espiritual, esperada para o bom desempenho do exercício ministerial. A Dra. Helena Mézerville, renomada terapeuta que se dedica à formação sacerdotal, assim se expressa em sua obra “O desgaste da vida sacerdotal”: “A fortaleza emocional é provavelmente a pedra angular do bom ajuste psicológico e repercute não só no bem-estar emocional dos próprios presbíteros, mas pode também afetar diretamente a execução e seu rendimento no trabalho pastoral” (2018, p. 83).
É imprescindível para o sadio exercício do ministério ordenado que a pessoa tenha certa maturidade emocional. Na esteira de Viktor Frankl, Dr. Gastón, psicoterapeuta com mundial experiência nas várias etapas da formação sacerdotal, define a pessoa madura “como aquela que, em determinado momento de sua vida, vai desenvolvendo um sadio sentido de identidade, um cálido sentido de pertença e fraternidade com seus semelhantes e um sólido sentido de missão como significado último de sua existência (Jesucristo, modelo de humanidad, 64).
Faz parte da formação daqueles que se preparam para assumir a vida ministerial serem ajudados a crescer em termos de maturidade humano-afetiva. “A saúde mental – esclarece a Dra. Helena Mézerville – se refere ao estado de equilíbrio entre uma pessoa e seu meio ambiente, de sorte que suas vivências emocionais, sociais e de trabalho lhe permitem bem-estar e qualidade de vida” (2018, p. 25). Assim, o formando precisa estar aberto à relação com outras pessoas, na vida de família, nas comunidades onde atua na pastoral, com os colegas de comunidade e de estudo, etc.
Esse aspecto relacional é importante, mas não é suficiente. Quase sempre a pessoa precisa de um suporte profissional para dar conta de atingir nível razoável de autoconhecimento e autocuidado. Para isso serve o acompanhamento terapêutico de psicólogos, pedagogos e, se for o caso, até de psiquiatras. A terapia é recomendada a todas as pessoas. Não é privilégio reservado a quem possa estar psicologicamente abalado. Ajuda muito no crescimento pessoal, superando certas carências e traumas presentes na história e no desenvolvimento psicológico da pessoa.
O documento da CNBB, “Diretrizes para a formação dos presbíteros da Igreja no Brasil”, indica pistas de ação na dimensão humana nestes termos: “prioridade ao amadurecimento da personalidade do vocacionado; continuidade do discernimento vocacional; aprimoramento da formação humana; atenção especial centrada na pessoa do formando, por intermédio de acompanhamento personalizado, psicoterapia, dinâmicas de grupo; promoção do conhecimento de si mesmo, das qualidades, defeitos e limites; orientação sobre a sexualidade masculina e feminina; formação da consciência e do caráter; equilíbrio no relacionamento interpessoal” (Doc. 110 da CNBB, nº 130, letra a).
Na Arquidiocese de Uberaba, contamos com uma profissional já experiente no atendimento a religiosos que acompanha os candidatos ao ministério ordenado desde os encontros vocacionais, passando pelos propedeutas, seminaristas e alguns padres. Esse acompanhamento terapêutico se tem mostrado eficaz, colaborando para a superação do nível de ansiedade, ajudando no autoconhecimento e no enfrentamento de desafios humanos e relacionais.
Padre Geraldo Maia