Nós e nossos irmãos em tempo de isolamento social

Estamos vivendo um tempo dificílimo no contexto mundial e não é diferente em nosso País, nosso Estado e nossa cidade. Uma realidade jamais imaginada. Tempo de mudanças sem estarmos preparados para tanto. De uma hora para outra, as relações não são mais as mesmas e nosso cotidiano de idas e vindas se transformou, de fato, ao que era apenas de passagem e reconstrução de nossas energias diárias. E agora, como ficam as relações humanas frente a essa nova realidade?
Penso que não se constroem novas relações apenas pelo fato de estarmos vivendo um outro contexto histórico e de imensuráveis dores físicas sem tocar, de maneira profunda, nas dores da alma e do espírito. É preciso relembrar que tão somente sentindo e entendendo essas dores é que nos possibilitamos realmente solidarizar com as dores dos outros.
Ora, se não assumirmos as dores de nossos irmãos como sendo nossas dores, não seremos tocados pela Misericórdia Divina, pois o amor coletivo é que nos aproxima do amor de Deus.
 
Dessa maneira, é preciso que aprendamos com o sofrimento, que comecemos a olhar com os olhos da compaixão os que sofrem, muitas vezes vistos como “estrangeiros”, pelo simples fato de não fazerem parte de nossas vidas. Amar o próximo é estar atento às ações que nos colocam cada vez mais em proximidade com a prática de oferecer ao outro o que desejamos a nós.
 
Diante de uma nova realidade que nos leva a isolarmo-nos socialmente, por uma “quarentena” forçada pelas circunstâncias, como poderemos fazer com que nossas ações se reflitam na vida do outro? Para nós, cristãos, sabemos que a oração é imprescindível, pois ela alimenta a alma e nos coloca próximos de Deus e em comunhão com os irmãos. No entanto, a oração (e as obras de misericórdia espirituais: ensinar os ignorantes, dar bom conselho, corrigir os que erram, perdoar as injúrias, consolar os tristes, sofrer com paciência as fraquezas de nosso próximo e rezar a Deus por vivos e defuntos) sem uma ação efetiva e comprometida (e as obras de misericórdia corporais: dar de comer a que tem fome, dar de beber a quem tem sede, dar pousada aos peregrinos, vestir os nus, visitar os enfermos, visitar os presos, enterrar os mortos) pode levar-nos à ausência do compromisso efetivo com Deus e com nossos irmãos. Sendo assim, nossa verdadeira oração deverá ser uma síntese da vivência profunda e solidária entre eu, o outro e Deus conosco.
 
Alguém pode estar se perguntando nesse momento: Como construir uma ação de solidariedade com a dor do outro se estou ausente em sua vida? Vamos tentar responder tal indagação, trazendo para reflexão uma passagem do Evangelho de Mateus (25, 34-36), em que Jesus nos diz: Reconhecer e encontrar Jesus, nesses tempos de isolamento, é abrir o coração e praticar as obras de misericórdia: dar de comer a quem tem fome, dar de beber a quem tem sede, cuidar dos enfermos, visitar os presos e acolher os estrangeiros. Se não podemos efetivar essas ações no encontro com nossos irmãos, corremos o risco de tornar esses dias difíceis apenas uma quarentena vazia de sentido humano e cristão e reduzi-los a um refúgio, à proteção individual ou familiar: “Toda vez que o fizestes a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes!”. Fica o apelo para cada um sobre o que fazer, como uma oração na ação, uma vez que alternativas é que não faltam.
 
Maria Rita Nascimento Pereira
Coordenadora da Pastoral da Educação da Arquidiocese de Uberaba

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