Questão: Onde falta ação e sobeja oração e onde falta devoção e sobeja ação, como estabelecer o espaço dialógico que permite o consenso, a concórdia e a união?

Pastorais, Movimentos Devocionais e Grupos de Oração

 

Assembleia Eclesial, construção do espaço dialógico da Escuta

O Papa Joao Paulo II, no dizer de Víctor Codina, “se sentia na responsabilidade de escutar a petição das comunidades cristãs que solicitavam um exercício do primado que, sem renunciar de nenhum modo ao essencial de sua missão, se abrisse a uma situação nova, e por isso pede a luz do Espírito para que pastores e teólogos das Igrejas busquem juntos as formas segundo as quais este serviço de fé e de amor se possa realizar de modo que seja reconhecido.

E acrescenta:

” Tarefa imensa, que não podemos recusar, mas que sozinho não posso levar a bom termo. A comunhão real, embora imperfeita, que existe entre todos nós, não poderia induzir os responsáveis eclesiais e os teólogos a instaurarem comigo, sobre este argumento, um diálogo fraterno, paciente, no qual nós pudéssemos ouvir, pondo de lado estéreis polémicas, tendo em mente apenas a vontade de Cristo para a sua Igreja, deixando-nos penetrar do seu grito: « Que todos sejam um (…), para que o mundo creia que Tu Me enviaste » (Jo 17, 21). (1)

Se lançarmos nosso olhar sobre o momento presente da Assembleia Eclesial, o nosso processo de Escuta, a partir dessa perspectiva que Victor Codina nos abre, vamos enxergar a iniciativa dessa caminhada sinodal como uma abertura inédita na imensa seara cristã de Evangelização, – o serviço de fé e de amor que o clero desenvolve. Uma abertura que se dirige aos leigos, um portal que se descerra e convida a todos para participarem. Não somente desse processo de Escuta, ou da própria Assembleia, mas de um tempo novo que certamente virá. A leitura crítica da realidade atual da Igreja não deixa dúvida de que mudanças se fazem necessárias porque os indicadores desta realidade permitem um prognóstico nada favorável à própria continuidade da fé católica.

Por outro lado, temos, no contexto da atualidade, alguns elementos que pedem atenção, com destaque para o espaço dialógico que permita o entendimento entre as tendências que se estranham no seio da Igreja Católica. Proliferam movimentos com práticas devocionais e oracionais intimistas, não raro em busca de experiências místicas, sem a inclusão de ações, gestos concretos de misericórdia mediante um trabalho pastoral objetivo. E se multiplicam iniciativas com maior enfoque no trabalho pastoral que não incorpora com tanta intensidade a prática devocional, manifestando, por vezes, até mesmo, uma certa rejeição ao enfoque estritamente devocional como algo que conduz a uma espécie de alienação.

Os componentes que definem o perfil e a prática que essas tendências privilegiam, pedem um reequilíbrio de forças que compreendemos como oração, reflexão e ação. Esse reequilíbrio, no entanto, não parece ser do interesse de cada uma dessas tendências. Aqueles que optam por participar de movimentos devocionais e carismáticos resistem à conclamação para partilharem o que têm e assumirem responsabilidades pelos que sofrem, não com um sentido apenas caritativo que faz a manutenção da pobreza, mas, por meio de ações que garantam aos indivíduos a necessária competência para efetivamente lutarem por uma melhor qualidade de vida para si. E aqueles que optam pelo trabalho pastoral rejeitam, muitas vezes, os movimentos devocionais e carismáticos, por não encontrarem nesses um envolvimento mais profundo, sensível e proativo para com a realidade do sofrimento da maioria da população.

Todas essas vertentes com suas singularidades, acabam encontrando em ideologias especificas, fundamentos em que se baseiam para desenvolver suas argumentações e justificar suas opções em vários setores da vida humana também. Na atualidade, os destaques que promovem as polarizações são os movimentos políticos e filosóficos, a questão político-partidária, a responsabilidade social de indivíduos e empresas para com a sociedade em geral, o problema dos direitos humanos, o Estado Democrático de Direito e o Estado Mínimo, a economia solidária e a economia baseada no livre jogo das forças do mercado, entre outros.

A polarização gerada por todas essas questões, por sua vez, redunda em tomada de atitudes por milhões de pessoas que afetam, de forma contundente, a vida de todos. O consenso e a concórdia nesse quadro histórico que vivemos, de extrema gravidade, ficam, de certa maneira, inviabilizados.

Todos aqueles, seja qual for o tipo de movimento eclesial ao qual aderiram, que constatam a gravidade da situação que vivemos, estão cientes dos riscos que ela encerra e do prognóstico que se pode vislumbrar.

A necessidade urgentíssima é realmente de que haja consenso para que, a partir da leitura crítica da nossa realidade – a realidade da Igreja e do mundo em que vivemos- possamos unir forças no sentido de nos dedicarmos à nossa Evangelização.

Por quê “nossa” Evangelização? Porquê como disse Frei Luís Antônio Alves, OP em sua homilia feita no dia 22 de maio de 2017 na Igreja de Santa Rita de Cássia, “o que está faltando no mundo, são gestos e atitudes de Jesus”. Precisamos nos Evangelizar, ou seja, agir como Jesus agiu e sustentar nosso padrão de comportamento fundado na compaixão que distinguia, marcava, impulsionava os gestos de Jesus.

Fica claro, aqui, um conceito de Evangelização que se funda exatamente na oração que Jesus permanentemente fazia, no estudo e na reflexão bíblica que ele também fazia, entrando nas Sinagogas para ensinar, ou seja, convocando as pessoas à escuta da Palavra de Deus e exemplificando, ininterruptamente, como colocá-la em prática. Se centrarmos nossa atenção nesses três aspectos, portanto, estaremos permanentemente nos evangelizando.

Mas não conseguiremos fazer essa auto evangelização sozinhos, essa atividade é relacional, precisamos da convivência com o outro para realizá-la, precisamos agir nos relacionando e interferindo positivamente na existência de nosso semelhante.

« Que todos sejam um (…), para que o mundo creia que Tu Me enviaste » (Jo 17, 21).

São João Evangelista nos oferece essa compreensão da unidade da Igreja, que na convocação da Assembleia Eclesial de caráter sinodal, põe em evidencia o caminhar junto de Presbíteros, Bispos e Leigos.

Sobrevém, então, a angústia diante do que constatamos: onde falta ação e sobeja oração e onde falta devoção e sobeja ação, como estabelecer o espaço dialógico que permite o consenso, a concórdia e a união?

Se queremos aproveitar essa abençoada oportunidade que a Assembleia Eclesial da América Latina e Caribe nos oferece obtendo a adesão e a participação de grande número de pessoas, católicas ou não, precisamos meditar sobre essa Escuta que, feita com sensibilidade, compaixão e sensatez, promove, sim, esse tão necessário espaço dialógico que por sua vez, viabiliza a conversão que a Igreja demanda e o próprio mundo precisa.

 

Rita De Blasiis

Uberaba, 23 de julho de 2021

 

Referências Bibliográficas

CODINA, Victor. “Não extingais o espirito” (1Ts 5,19): Iniciação à Pneumologia. São Paulo: Paulinas,2010, p.200..

JOAO PAULO II. Ut unum sint, n.96.

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