ORIGEM E VOCAÇÃO
Neste ano de 2020 estamos comemorando os 190 anos da fundação da Capela do Santíssimo Sacramento, que deu origem à cidade de Sacramento. Uma data memorável que nos induz a revolver terras antigas, procedimentos extraordinários, intenções ainda não analisadas e a predestinação que cercam a criação desta cidade do Santíssimo Sacramento. O que nos faz revolver essas terras e analisar procedimentos são as particularidades que envolveram o processo de formação da cidade. São minúcias silenciadas pelo tempo, mas que gritam no tempo presente para serem descobertas, avaliadas, acatadas e, sobretudo, vivenciadas.
Há que se estudar antes a intenção, o porquê, a causa que levou à fundação da cidade. Essa causa primária necessariamente esclarece a intenção do ato fundador. É o que o Direito chama de “vontade real”, subjetiva, todavia imperiosa para quem praticou um ato. Buscando a elucidação da intenção, chega-se à conclusão do ato efetivado.
É a “vontade real” do fundador da cidade de Sacramento, Cônego Hermógenes Cassimiro de Araújo Brunswik, que vamos tentar desvendar, observando e minuciando a ata da fundação da cidade de Sacramento que temos em mãos.
O que pretendeu esse homem? O que visualizou com seu olhar eclesiástico, nestas terras que margeiam o Ribeirão Borá? Que segurança nós podemos ter de que ele observou exatamente o que vamos sustentar aqui? São essas indagações que procuramos desvendar.
Naquele ano de 1820, o antigo Julgado do Desemboque ainda era um lugar destacado, de famílias prósperas, de consideráveis fortunas e de milhares de moradores. Muito perto dali, levando-se em conta as distâncias daquele tempo, já prosperavam o arraial de Santo Antônio e São Sebastião de Uberaba e o Julgado de São Domingos de Araxá. Eram distâncias vencidas por três dias de viagem, o que, para o padrão da época, quase nada representavam. Havia, desde 1812, uma picada aberta desde o Desemboque até Uberaba e uma estrada ligando a São Domingos de Araxá e dali ao Julgado de Paracatu do Príncipe. Então, a gente da época não sentia o isolamento social, o sertão já estava bem povoado. No entanto, entre a pequena distância de Desemboque e Uberaba, o vigário daquele lugar, Cônego Hermógenes, sentiu a necessidade de fundar um lugar para ser o “Pasto Espiritual” do sertão. Nota-se, na análise da documentação, que Cônego Hermógenes pretendeu antes de qualquer coisa dar aos viandantes do sertão um lugar espiritual, tanto que fundou uma capela diferente de todas as demais que havia no sertão.
Na fundação de um arraial, quase que em geral, tomava-se o nome do santo do dia e o tinha por padroeiro. Não se escolhia data para fundar uma povoação; isto se dava aleatoriamente num achado ou num acontecimento extraordinário qualquer.
Na fundação da cidade de Sacramento, o “lugar do Pasto Espiritual”, no entanto, o tempo foi fator preponderante: o fundador escolheu o dia e o patrono. Cônego Hermógenes escolheu fundar Sacramento numa quinta-feira, porque é o dia em que a Igreja Católica reverencia, de modo soleníssimo, o Santíssimo Sacramento. Escolheu o dia e, sobretudo, escolheu o orago: o Santíssimo Sacramento, isto é, o próprio Deus na hóstia consagrada. Como religioso e homem que convivia com os sertanejos, deveria observar o santo do dia, esse era o costume, mas ele não fez isso. Assim, a fundação de Sacramento foi coisa diferenciada no sertão da época, mesmo porque, até hoje, não se encontra nenhuma cidade em solo brasileiro que tenha surgido dessa invocação suprema, o Santíssimo Sacramento.
Como sacerdote católico, extremamente culto, homem das letras e da fé, estava consciente de que criava, na fundação daquela capela, um lugar especial de adoração ao Deus Vivo. O fundador frisou na ata da fundação da capela que deu origem à cidade, que cumpriu rigorosamente o ritual Romano, e não nos resta dúvida que o hino “Tantum Ergo Sacramentum” foi cantado na exposição e bênção do Santíssimo Sacramento, naquela memorável manhã do dia 24 de agosto de 1820. Sendo assim, esse hino poderia ser também o Hino Oficial de Sacramento, o que nos assegura, sem sombra alguma de dúvida, de que Sacramento nasceu ao som desse hino secular da Igreja. Isso nos enche de ufanismo porque em todo o universo onde a Igreja Católica se faz presente o cantar desse hino, além de ser um devotamento de adoração ao Senhor Deus, é também para nós a solene memória do nascimento de nossa cidade.
E o que é interessante também é que não resta dúvida de que a fundação da cidade de Sacramento foi um ato de fé e não um procedimento civil interesseiro na povoação do sertão. Sacramento nasceu para ser lugar de adoração ao Santíssimo Sacramento, verdade insofismável da vivência cristã. O Santíssimo Sacramento é o Pasto Espiritual a que o fundador se referiu na ata de fundação.
E há que se ressaltar ainda que, naquela manhã, ele fundava primeiramente uma capela e não uma cidade, muito embora fosse essa sua intenção secundária, pois para tanto havia adquirido as terras que formariam o patrimônio. O patrimônio induz a prosperidade de uma povoação. Primeiramente ele criou a Casa de Deus, diferente de todas as demais capelas do sertão, pois a dedicou ao Santíssimo Sacramento apresentado pelo Patrocínio de Maria. Da capela veio a cidade, como consequência natural. E a capela foi fundada para ser lugar de adoração. Assim, pela vontade do fundador, todos os filhos de Sacramento, de todas as épocas e origens, são filhos da adoração ou, pelo menos, tem sua vocação originária na solene e sagrada reverência ao Senhor Sacramentado.
Isso sela a fundação, isto explica toda a intenção do fundador. Queria que Sacramento fosse realmente um lugar especial de adoração.
Bendita seja sua memória!
COMEMORAÇÕES DO ANO BICENTENÁRIO
Uma vasta agenda de comemorações foi idealizada pela Paróquia-Basílica do Santíssimo Sacramento, através de seu pároco, Padre Ricardo Alexandre Fidelis, para marcar os 200 anos da fundação da Capela, que deu origem à cidade de Sacramento. Toda seu intento recebeu de nosso arcebispo, Dom Paulo Mendes Peixoto, o deferimento e o incentivo. Assim foi decretado desde a Festa de Cristo Rei de 2019 até o dia 24 de agosto do presente ano o “Ano Eucarístico Paroquial” que, apesar de ter toda a programação prejudicada pela Pandemia do COVID-19, mesmo assim tem sido vivenciado através das redes sociais. Programou-se também para acontecer em Sacramento o Congresso Arquidiocesano Eucarístico e as Missões Redentoristas por equipe de padres de Aparecida e São Paulo. Infelizmente, essas atividades foram suspensas. Mas Deus, em sua infinita bondade e misericórdia, saberá compensar Sacramento e seus filhos por essa luta de ver implantado aqui o “Trono Eucarístico da Graça”, o triunfo do Coração Eucarístico de Jesus e do Coração Imaculado de Maria. Assim queremos, assim suplicamos, assim esperamos e, com muita fé na bondade divina, esperamos a realização.