Unidos na privação e na esperança

Após assistir a alguns vídeos de jovens suplicando aos bispos que lhes “devolvam” a missa e mesmo de muitos fiéis que se manifestam nas redes sociais dizendo como sentem falta de participar da missa, me senti motivado a refletir sobre a decisão de nossos bispos de suspenderem a celebração comunitária da missa.

Dentre aqueles que defendem que voltemos a celebrar as missas comunitárias, poderíamos encontrar o seguinte argumento: “todos estariam protegidos (com máscaras e álcool), impediríamos de participar os que estão no grupo de risco (idosos, diabéticos, cardíacos etc.) e poderíamos até guardar alguma distância uns dos outros”. Outros, aparentemente mais criativos e prudentes quanto à ameaça do COVID-19, poderiam ainda propor: “façamos um drive-thru eucarístico no qual os fiéis receberiam a comunhão de dentro de seus carros”.

Inspirado por uma mensagem recentemente veiculada pelo bispo de Divinópolis, Dom José Carlos de Souza Campos, me faço o seguinte questionamento: Vale passar na igreja de carro ou a pé e pegar ‘seu pedaço’ de Eucaristia e ir embora, sem celebração, sem assembleia litúrgica, sem saborear a vida comunitária celebrante? Ainda: Vale promover uma “eugenia espiritual” na qual dizemos quem são aqueles que podem participar da missa comunitária e quais não podem? Parece-me ser mais justo e bíblico seguirmos precisamente a orientação de nossos bispos: sigamos unidos todos na mesma privação, na mesma tristeza, mas na mesma esperança. “Viviam unidos e tinham tudo em comum” (At 2,46).

Este tempo de isolamento forçado pode ser convertido em tempo de amadurecimento na fé. Por que não redescobrimos o sentido da Igreja como “Corpo Místico de Cristo” (1Cor 12,12-14)? Ainda seguindo a reflexão de Dom José Carlos, ele nos diz: “Todos estamos interligados e unidos a Ele, nossa Cabeça e Princípio. Se uns comungam, o Corpo todo se alimenta. Somos um Corpo e não simplesmente sujeitos crentes individuais, com a necessidade de cada um ter de se alimentar para alimentar, só desta forma, o Corpo inteiro. A santidade de um santifica o Corpo; o pecado de um mancha o Corpo; a comunhão sacramental de um alimenta o Corpo”.

Por que não reaprendemos a ser igreja doméstica? Muitos bons subsídios surgiram nesse tempo extraordinário para nos ajudar nesse sentido. Eis alguns bons exemplos: a Paróquia São Mateus (Uberaba) criou uma iniciativa denominada “De esperança em esperança” que promove a liturgia nas casas; a CNBB tem fornecido roteiros para celebrações domésticas entre a família; o Papa Francisco nos pede que especialmente nesse mês de maio rezemos diariamente o santo terço em nossas casas.

Em tempos de jejum da Eucaristia – presença real e substancial de Jesus Cristo – possamos nos deixar eucaristizar na “comunhão espiritual” que nos chega, pois fazemos parte de um único Corpo; possamos aprender a encontrar também Jesus – real – em sua Palavra e uns nos outros, sobretudo aqueles de nossas famílias. Unidos na privação, nos façamos unidos também na esperança.

Sem. Vitor Lacerda

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